Mercado

Terceirização chega ao canavial

A expansão dos canaviais para novas regiões está provocando mudanças do setor, entre elas a terceirização de boa parte das operações agrícolas e de logística das usinas. É uma tendência confirmada pelas indústrias de máquinas e implementos agrícolas, que têm vendido lotes de tratores e colhedoras para empresas que, embora não possuam nem 1 hectare de cana, são especializadas em cultivo, manejo, corte e transporte.

“Esse tipo de serviço está crescendo”, diz o gerente-regional de Vendas da John Deere, José Luís Coelho. “As usinas concentram, cada vez mais, o foco no seu negócio, que é moagem, produção de açúcar e álcool e comercialização.”

Segundo Coelho, há várias empresas atuando nesse segmento, algumas das quais se especializaram no chamado CCT – corte, carregamento e transporte da cana -, etapas que exigem maior volume de investimento na compra de máquinas, veículos de transbordo, além de caminhões e carretas mecânicas, que fazem o transporte da cana até as indústrias.

ESPECIALIZAÇÃO

Há empresas especializadas em uma única atividade no canavial, como a Consult Agro, de Piracicaba (SP), que só faz tratamento fitossanitário na cana. Outro prestador de serviços para o setor, Daniel Gadoti, tem uma frota de mais de 75 tratores para atividades que vão do preparo do solo à colheita. “Só não fazemos tratamento fitossanitário”, afirma Gadoti.

Uma das usinas que utilizam serviços de terceiros é a Alvorada do Oeste, de Santo Anastácio, região de Presidente Prudente (SP). Segundo o diretor da empresa, Tarcísio José Marques, desde que foi reaberta, há dois anos, a usina – que moerá 450 mil toneladas de cana esta safra – passou a terceirizar as operações de preparo do solo e o transporte da cana. “Só não terceirizamos as etapas que utilizam insumos e as que exigem muita técnica”, afirma, e acrescenta que o transporte é totalmente terceirizado.

Marques aponta duas vantagens: “Não gastar grandes volumes de recursos na compra de máquinas e contar com serviço especializado.” Ele explica que as empresas trazem máquinas, implementos e o pessoal necessário para realizar a gradagem, a aração e a curva de nível, trabalhos realizados o ano todo.

SERVIÇO SAZONAL

Desde 2003, quando o Grupo Olival Tenório, do Nordeste, comprou a Destilaria Decasa, em Caiuá, região de Presidente Prudente, a usina passou a terceirizar os serviços de mecanização, parte do manejo e dos tratos culturais, além do transporte de cana. Cerca de 70% das operações de tratos culturais da cana-soca são próprias e 30% terceirizadas. “Em tudo o que é sazonal não vale a pena imobilizar recurso próprio”, diz o gerente-geral, Hélio Tavares.

A Decasa optou por um modelo misto: metade das máquinas para o plantio é própria e, o restante, terceirizado. “Como o plantio se concentra de março a junho, não preciso manter uma frota grande de máquinas o ano todo”, diz Tavares. Para o transporte, o raciocínio é o mesmo: a exigência é de um volume grande, mas concentrado em alguns meses, razão pela qual 60% da frota de transporte de cana é terceirizada e 40% própria.

A filosofia da Decasa é não imobilizar capital, nem equipamentos, nem em terra. O canavial é cultivado em 100% de terra arrendada. “A gente ganha mais dinheiro plantando cana e produzindo do que comprando terra”, diz. “Com isso, liberamos recursos para plantar e fazer o negócio girar.” Este ano a usina vai moer 900 toneladas, sendo 85% da cana de produção própria e 15% de fornecedores.

Os irmãos Biagi, donos das Usinas Buriti, em Buritizal; da Pedra, em Serrana, e Ibirá, em Santa Rosa do Viterbo, todas em São Paulo, utilizam serviços de terceiros na parte de mecanização, colheita e transporte. “Já tivemos até no plantio manual, mas estamos fugindo da terceirização, para evitar problemas trabalhistas”, afirma o diretor da empresa, Eduardo Biagi. “Só não temos terceiros no corte de cana.”

TRANSPORTE

Há mais de dez anos, a Usina São João, em Araras (SP), terceiriza também o transporte da cana. “A unidade de carga (a carreta) é minha, que entrego carregada. O terceiro só faz o engate do cavalo (o caminhão) e leva o produto para a usina”, explica o gerente de Motomecanização da usina, Humberto Cesar Carrara. A vantagem de terceirizar o transporte, conforme Carrara, é que a empresa pode direcionar o foco no seu negócio, a produção de cana. “E o serviço tem garantia de qualidade, segurança e o custo do transporte é diluído, pois existem vários setores que também podem usar o mesmo veículo, como o setor madeireiro.”

Nesta safra, a São João vai moer 3,2 milhões de toneladas de cana, sendo 2,8 milhões de toneladas de produção própria. A nova unidade do grupo, a Usina São Francisco, em Quirinópolis (GO), entrará em operação entre julho e agosto, com previsão de moagem de 700 mil toneladas.

Formar condomínio reduz custo

Maquinário e mão-de-obra são compartilhados entre produtores

Nas regiões de expansão da cana, a tendência, entre os produtores, é formar condomínios ou associações para reduzir custos. Segundo o presidente da Associação de Produtores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo (Canoeste), Manoel Ortolan, os produtores reúnem-se, dimensionam os serviços de plantio, tratos culturais e colheita e, juntos, em condomínio, contratam a mão-de-obra. Além disso, já terceirizam parte da mecanização e do transporte, e a aplicação de herbicidas e o monitoramento de pragas de solo e de formigas. “A terceirização de plantio também está começando”, diz Ortolan.

O Condomínio de Empregadores Rurais de Sebastianópolis do Sul (SP), criado em 2003, formado por 25 produtores de cana, a maioria pequenos, foi montado para resolver o problema de contratação de mão-de-obra rural. Segundo a consultora do grupo, Jane Cecilia Cera Brambilla, a vantagem do novo sistema, explica, é que, em vez de o trabalhador ficar um mês prestando serviço para uma pessoa específica, ele é registrado e trabalha para vários produtores do condomínio. “Assim, eliminamos problemas trabalhistas, organizamos os trabalhadores e proporcionamos segurança, como equipamentos de proteção, além de fornecer transporte e cumprir outras exigências trabalhistas”, diz. “ Individualmente, muitas vezes o produtor não consegue isso.” Conforme Jane, que ajudou a montar, no começo do ano, o Condomínio de Empregadores Rurais de General Salgado, com oito produtores de cana, “melhoramos, também, o aproveitamento do maquinário”.

COOPERATIVA

A Associação dos Plantadores de Cana de Monte Aprazível (SP) fundou a Cooperativa Agrícola de Monte Aprazível em 1990, para realizar plantio, colheita e corte, além da administração da logística. Segundo o presidente da entidade, João Thomaz Leal Pimenta, os produtores associados contratam os serviços da cooperativa, que recebe por tonelada de cana colhida. Conforme Pimenta, todo o pessoal que trabalha no campo também é contratado pela cooperativa.

Para o transporte e o carregamento, os produtores formam grupos: um entra com o caminhão; outro com o trator, além de contratar algum serviço de terceiros conforme a necessidade. São 200 associados, que entregam 12 mil toneladas de cana/dia para 4 usinas. A previsão, para este ano, é a de colher 2,2 milhões de toneladas, em 35 mil hectares. B.M.

Expansão dos plantios deve prosseguir

A expansão dos canaviais para o oeste paulista e o Centro-Oeste segue a passos firmes e largos. A menos que componentes extras, como clima, doenças e conjunturas externas, mudem o rumo das coisas, a cana continuará sendo um bom negócio até a próxima década, diz o presidente da Canoeste, Manoel Ortolan. “No contexto do crescimento da frota de carros flex, da questão ambiental e do alto custo do petróleo, o cenário é bastante favorável ao Brasil.”

“As perspectivas são promissoras se tudo o que se fala do álcool for concretizado”, diz o diretor da Usina da Pedra, do Grupo Serrana, Eduardo Biagi. No entanto, ele alerta para o risco de superprodução, diante da quantidade de novas usinas que estão sendo instaladas. “Há muita gente de fora do setor entrando, inclusive grupos estrangeiros.” Para esta safra, por exemplo, já está prevista produção recorde, de 470 milhões de toneladas de cana, conforme levantamento da Conab, divulgado na semana passada.

BOA FASE

O gerente-regional de Vendas da John Deere, José Luiz Coelho, considera que o setor sucroalcooleiro continuará em expansão, principalmente em São Paulo, que tem mais de 40 projetos de usinas em instalação. “São Paulo virou uma das maiores fronteiras agrícolas do País para a cana, que deve continuar avançando, principalmente na área de pastagem.”

Segundo Coelho, as novas usinas paulistas estão crescendo num modelo interessante: as usinas compram somente a terra onde será construída a indústria e a cana é cultivada em terra arrendada, ao contrário dos modelos de usinas das regiões tradicionais de cana – Ribeirão Preto e Sertãozinho -, nas quais mais de 80% das terras são da própria usina.

Coelho diz que a cana deixou, também, de ser só matéria-prima para a produção de açúcar e álcool e passou a ser olhada como fonte de energia. “As usinas hoje fazem até açúcar e álcool”, brinca. “São auto-suficientes em energia e também fazem a co-geração, o que é importante porque a safra da cana coincide com a época de seca.” Há regiões em que não chove de abril a outubro, daí a importância da energia que vem da cana. “Na entressafra, 1 tonelada de bagaço de cana chega a valer mais que a própria cana. E não falta comprador.”

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