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Combustível fóssil impulsiona presidente "verde"

Há quatro anos, Barack Obama prometeu promover uma revolução verde, ao dizer que o governo apoiaria tecnologias energéticas alternativas capazes de criar 5 milhões de empregos e liberar os Estados Unidos da dependência dos tiranos do petróleo estrangeiros.

Hoje, o setor energético é um dos principais motores da alta do nível de emprego e os EUA estão mais próximos do que em qualquer momento dos últimos quase 20 anos de atender às suas próprias necessidades energéticas. Mas a transformação – puxada pela escalada da produção de petróleo e gás natural – não é primordialmente verde, e pouco tem a ver com os planos do presidente.

“Estamos migrando para a independência energética por acaso”, disse Philip Verleger, que comandou a divisão de política energética Departamento do Tesouro dos EUA no governo Jimmy Carter e atualmente trabalha como consultor do setor. “A política energética não teve nada a ver com isso.”

O surto de crescimento da produção de petróleo e gás natural está configurando uma ironia de ano eleitoral: um presidente favorável à energia verde que ganha um empurrão dos combustíveis fósseis.

A extração de petróleo e gás natural está em expansão em grande medida devido à técnica de fratura hidráulica (“fracking”, em inglês), que deu às empresas de prospecção acesso a reservas em formações rochosas de xisto, cuja produção antes era cara demais. O “fracking” consiste em injetar milhões de litros de água, areia e produtos químicos a milhares de metros abaixo da superfície para liberar os combustíveis fósseis presos ali – processo que, segundo os aliados ambientalistas de Obama, aumenta a poluição do ar e da água.

O “fracking” está liberando o petróleo contido no subsolo dos Estados de Dakota do Norte e Texas. E, mais importante para as chances de reeleição de Obama, está contribuindo para a produção de gás natural – e para os índices de intenção de voto de Obama – em Ohio e Pensilvânia, Estados-pêndulo (ou “swing states”), com um total conjunto de 38 votos no colégio eleitoral.

A taxa de desemprego de Ohio estava em 7,2% em julho, a mais baixa desde setembro de 2008 e inferior aos 8,3% vigentes no país como um todo. A expansão do nível de emprego no Estado é a quarta mais acelerada do país, segundo dados do governo federal. O índice de desemprego da Pensilvânia é de 7,9%, inferior aos 8,7% alcançados em março de 2010. O presidente pouco fez para deter a expansão do “fracking”, apesar das pressões de seu próprio Partido Democrata.

“De muitas maneiras diferentes, isso está alimentando vários setores da economia”, disse Philip Sharp, ex-membro democrata de Indiana na Câmara dos Deputados e líder do grupo de pesquisas ambientais Resources for the Future, em Washington. “O governo, ao que parece, meio que passou a reconhecer sua importância e não aderiu à ala ‘antifracking’.”

Quando assumiu a Casa Branca, Obama ofereceu uma visão diferente do futuro energético dos EUA, prometendo revitalizar uma economia acossada pela recessão e reparar o meio ambiente com uma investida em tecnologia verde, intensiva em exportações.

Como candidato em 2008, Obama prometera criar 5 milhões de empregos verdes em dez anos por meio de investimentos em energia solar, eólica e proveniente de outras fontes renováveis. Seu plano de incentivo à economia de 2009 gastou a soma recorde de US$ 90 bilhões em energia limpa.

Entre os sucessos de que o governo pode se gabar estão a duplicação da geração de energia solar e eólica e o aprimoramento de mais de 1 milhão de casas com calefação e refrigeração do ar a custos mais baixos. Um acordo com as montadoras para elevar a economia de combustível da frota reduzirá as emissões de dióxido de carbono e as importações de petróleo. Mesmo assim, só 225 mil postos de trabalho verde tinham sido viabilizados pelo programa de estímulo até 2010, segundo a Casa Branca.

A energia verde “é uma grande área de promessas não cumpridas”, disse Julian Zelizer, professor de história e comunicação social da Universidade de Princeton em Nova Jersey.

Os republicanos usaram o exemplo da fabricante de painéis solares Solyndra, da Califórnia, que fechou após obter uma garantia de empréstimo de US$ 535 milhões dos EUA, para retratar Obama como um agente fracassado do intervencionismo da poderosa máquina governamental no livre mercado. A rejeição, pelo presidente, do oleoduto Keystone XL, que levaria o arenito betuminoso de Alberta, no Canadá, até refinarias ao longo do litoral do Golfo do México, e a proibição de prospecção em águas profundas imposta após o vazamento da BP em 2010 desencadearam críticas de que Obama estaria focado demais em fontes energéticas alternativas.

“Precisamos de uma política energética para hoje, amanhã e daqui a 50 anos”, disse Karen Harbert, executiva do Instituto da Câmara de Comércio dos EUA pela Energia do Século XXI. “Não precisamos de uma política energética só para daqui a 50 anos.”

Postado em frente a uma unidade de beneficiamento de carvão em Ohio no dia 14 de agosto, o candidato republicano às eleições Mitt Romney criticou Obama por regulamentações como as reduções de emissões de gás de efeito estufa adotadas pelo Departamento de Proteção Ambiental. Seu plano prevê o fim dos subsídios à energia limpa e a expansão agressiva do desenvolvimento dos combustíveis fósseis.

A produção interna de gás natural pode ajudar Obama a enfraquecer a linha de ataque de que suas políticas ambientais prejudicam a economia, disse Paul Allen Beck, professor de ciência política da Universidade Estadual de Ohio em Columbus. “Há abertura natural para que Obama diga, ‘Não somos apenas reguladores'”, disse Beck. E, embora o governo esteja estudando a possibilidade de adotar salvaguardas federais sobre o “fracking”, até o momento não atravancou seu crescimento.

O EPA adiou a adoção de novos padrões de emissões para operações de gás natural por dois anos, atraindo os raros aplausos do American Petroleum Institute, grupo setorial sediado em Washington que tem entre seus membros as americanas Exxon Mobil e a ConocoPhillips.

Em janeiro, o presidente promoveu o desenvolvimento em gás natural em seu discurso O Estado da União, dizendo que ele poderá respaldar 600 mil postos de trabalho até o fim da década.

Obama acredita que o gás natural “tem papel central a desempenhar em nosso futuro energético”, disse Clark Stevens, porta-voz da Casa Branca, por e-mail. Stevens também se referiu ao crescimento da produção petrolífera como prova de que o presidente apoia o que qualifica de estratégia energética “baseada em todas as supracitadas”, que inclui desenvolvimento de petróleo e gás natural e benefícios fiscais para a exploração de fontes energéticas renováveis.

O panorama energético mudou sob aspectos que poucos teriam previsto quatro anos atrás. A produção de gás natural aumentou para 685,268 bilhões de metros cúbicos em 2011, a partir dos 597,485 bilhões de metros cúbicos de 2008. O aumento empurrou os preços para seu patamar mais baixo de uma década. Embora a queda dos preços pudesse desacelerar seu crescimento, o “fracking” também contribuiu para criar um renascimento industrial, impulsionando as siderúrgicas que fornecem as peças do poço, as empresas químicas que empregam o gás etano e outras fabricantes de uso intensivo de produtos energéticos.

Embora Obama não tenha conseguido a aprovação, pelo Congresso, de legislação destinada a combater a mudança climática, a nova tendência, de qualquer forma, está reduzindo os gases do efeito estufa, porque o gás natural responde por apenas metade das emissões de dióxido de carbono decorrentes da combustão do carvão. O Departamento de Informações Energéticas, que monitora e analisa dados referentes aos EUA, projetou pela primeira vez, alguns meses atrás, uma queda de longo prazo das emissões de gás de efeito estufa no país.

Empresas que planejavam construir unidades voltadas para a importação de gás natural liquefeito (GNL) para atender à demanda interna solicitam atualmente licenças de exportação, graças à expansão das reservas.

A produção de petróleo também está crescendo, dos 5 milhões de barris/dia de 2008 para quase 6,2 milhões de barris/dia neste ano, contribuindo para reduzir as importações para cerca de 42% do consumo americano. A queda da demanda, a maior produção de biocombustíveis e o aumento da produção interna se associaram para reduzir as importações de petróleo ao patamar mais baixo desde 1998, diz o Departamento de Informações Energéticas.

Os benefícios do surto de crescimento do “fracking” podem ser observados no Vale Mahoning de Ohio, um corredor industrial na região nordeste do Estado.

“Estamos vendo mais otimismo do que há muito, muito tempo”, disse o parlamentar democrata Tim Ryan, representante da região de Youngstown, em Ohio. “Neste momento há uma onda avassaladora de apoio por trás do setor de gás natural.” Cerca de 40% dos membros da Seccional 396 do sindicato dos montadores de oleodutos de Ohio estavam desempregados durante a recessão de três anos atrás. Roland “Butch” Taylor, diretor-executivo do sindicato, disse que as expansões das fábricas e as novas construções fizeram com que todos os seus 700 de seus membros estejam trabalhando.

Mais ao sul, nos Apalaches de Ohio, agricultores tem recebido bônus de ingresso das empresas de prospecção, o que permite a alguns pagar à vista colheitadeiras de US$ 250 mil, disse Amy Rutledge, diretora da Secretaria de Convenções & Visitantes do Condado de Carroll. “Esta sempre foi uma comunidade agrícola”, disse Amy. “Aqui sempre se escavou a terra, e agora o pessoal está tirando alguma coisa de verdade da terra.”

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