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Usinas começam a operar com futuros de petróleo e gasolina

Desde que a Petrobras decidiu reajustar diariamente os preços da gasolina A (pura), vendida às distribuidoras, com base na variação das cotações internacionais, algumas usinas de etanol passaram a avaliar a possibilidade de atuar nos mercados futuros internacionais de petróleo e gasolina, mesmo não produzindo nenhum dos dois produtos, para “proteger” suas margens em casos de queda dos preços.

Algumas empresas do setor estão estudando fórmulas que se aproximariam da nova estrutura de formação do preço da gasolina C (vendida nas bombas), com o qual concorre o etanol hidratado. Inclusive, já há quem tenha começado a realizar operações, como a Usina Alta Mogiana, de São Joaquim da Barra (SP).

A estratégia que está sendo avaliada pelas usinas é vender uma posição nos mercados futuros de petróleo ou gasolina nas bolsas de Londres e Nova York (ou Chicago), ou comprar uma opção de venda delas, em uma operação conjugada a um hedge de câmbio.

Dessa forma, se a companhia vende certo volume de petróleo ou gasolina e o contrato cai US$ 1 no dia seguinte, a empresa ganha esse US$ 1 multiplicado pelo volume acertado. Caso o preço suba, é preciso realizar um depósito de margem junto à corretora ou banco. Mas como as usinas não produzem nem petróleo nem gasolina, precisam liquidar suas posições antes de o contrato vencer.

Hoje, se o preço do petróleo ou da gasolina recua no mundo, a Petrobras repassa em alguma medida essa queda à gasolina A, que por sua vez é repassada, em alguma medida, à gasolina C das bombas. Mais barata, a gasolina C fica mais competitiva que o etanol, estimulando a cadeia do biocombustível a reduzir os preços. Desde que a Petrobras mudou a política, a gasolina vendida nas refinarias acumulou alta de 26,08%, enquanto a vendida nos postos subiu 20,21 – ante alta de 23,44% do concorrente etanol.

A Usina Alta Mogiana já atua nesses mercados futuros há alguns anos, mas até então eram operações marginais. Com a mudança da política da estatal, a usina desenvolveu um modelo próprio que buscou alinhar o preço interno do etanol aos preços mundiais de gasolina e petróleo.

Até agora, a Alta Mogiana já realizou operações que lhe garantiram margem para mais de 20% do etanol que deve produzir na safra 2018/19 (que começa oficialmente em abril), segundo Luis Gustavo Junqueira Franco, diretor comercial da usina. Na safra atual, a produção foi de 150 milhões de litros. Com as operações, a empresa estima obter mais de R$ 2 pelo litro do etanol, quase 10% acima dos preços atuais.

Segundo César Lauro da Costa, sócio da empresa de assessoria financeira Capitânia, é possível considerar essa operação como um “hedge financeiro”, já que a usina não produz o produto com o qual opera. “Não é especulação porque vai na direção da proteção. A empresa faria isso na proteção que ela necessita”, diz.

Para efeito contábil, porém, a tendência é que eventuais ganhos com a operação ainda sejam encaixados no balanço como receita financeira, e não operacional. “Dentro da norma atual, é até possível argumentar que é hedge, mas não temos visto casos ainda”, diz.

O analista afirma que a usina poderia operar com um volume de petróleo acima do equivalente ao que ela produziria de etanol em uma safra, já que pode “proteger” seus ganhos para mais de uma temporada. João Luiz Mascolo, professor do Insper, lembra que no passado empresas de outros setores foram enquadradas como especuladoras por terem operado com produtos financeiros em volume acima do considerado como hedge.

Essa engenharia financeira ainda é encarada com resistência pela maioria das usinas. Um dos motivos é a necessidade de boa saúde financeira – o que limita esse tipo de operação à parcela saudável, e não muito ampla, do segmento.

Outro motivo é a falta de transparência da Petrobras quanto à fórmula para calcular o preço da gasolina A. A estatal não divulga com quais contratos futuros utiliza como base, mas, em documentos públicos, a empresa menciona as oscilações dos futuros de petróleo Brent (comercializados na bolsa de Londres) e de gasolina Eurobob (referência para o produto do noroeste da Europa).

A Usina Alta Mogiana tem operado em futuros de Brent, de petróleo WTI (comercializado na bolsa de Nova York), e de gasolina RBOB (comercializado na bolsa de Chicago). “Usamos um ou outro, dependendo do viés do mercado. Mas acreditamos que nosso modelo tem aderência”, afirma Franco.

Também há incerteza sobre em que medida as oscilações da gasolina A chegam à gasolina C, já que há diferenças nas margens dos intermediários. Mas, para Costa, da Capitânia, a correlação é maior que 80%.

Há dúvidas também em relação à permanência desse tipo de política de preços no futuro. A recente mudança na política de preços do gás, por exemplo, gera desconfiança de que a Petrobras poderia fazer o mesmo com sua política para a gasolina.

Ainda assim, Franco diz que tem recebido muitas consultas a respeito de suas operações. Para o sócio da Capitânia, o momento mais alcooleiro da safra “contribui para a tomada de risco”, e a realização de tal “hedge” pode ser mais generalizada já em seis meses.

Fonte: Valor

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