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Tecnologia de caldeiras de leito fluidizado borbulhante se desenvolve com ajuda da Finlândia

foto Leonardo
Leonardo Zanini Cherubin, engenheiro

No não tão distante “século passado” – anos 80 e 90 – quando ouvíamos falar de Leito Fluidizado isso era uma coisa ainda um pouco “misteriosa” em nosso meio. Os nomes que se ouviam eram estranhos – Ahlström, Outokumpu, Tampella – e vinham de muito longe – um país de língua e clima muito diferentes do nosso Brasil tropical – a Finlândia. Em 30 anos essa realidade mudou muito e hoje é um bom exemplo de um futuro que já é presente.  A distância da Finlândia “diminuiu” muito – é claro que não em quilômetros, mas devido à globalização. A integração entre Brasil e Finlândia cresceu muito nos últimos anos devido ao pioneirismo e à experiência dos finlandeses em queimar biomassas em caldeiras de leito fluidizado – borbulhante e circulante.

Afinal, porque esta tecnologia está dominando as discussões técnicas, palestras e apresentações no setor ? Porque o pioneirismo e a evolução do leito fluidizado se deram na Finlândia?

Algumas características específicas da Finlândia propiciaram o desenvolvimento desta tecnologia: 1- baixa disponibilidade de combustíveis fósseis; 2- alta disponibilidade de biomassas diversas, 3-longo período do ano com clima frio e muita neve, 4- alta disponibilidade de turfa – um resíduo de vegetações antigas com alta umidade encontradas em abundância naquele país. Devido a alta umidade, difícil homogeneização e controle de granulometria, estes combustíveis (cavacos, cascas, folhas, raízes e turfa)  possuem baixa eficiência de queima em caldeiras de grelhas convencionais. Desde os anos 60, a tecnologia de leito fluidizado borbulhante foi pesquisada e desenvolvida, e hoje proporciona a cogeração de mais de 10% da energia elétrica e grande parte do aquecimento de água residencial da Finlândia, queimando biomassas que não poderiam ser adequadamente utilizadas com tecnologias convencionais.

Em nossa região a tecnologia do Leito Fluidizado Borbulhante começou a ser utilizada no início deste século. Um dos pioneiros acima tornou-se o líder mundial em fornecimento de caldeiras de leito fluidizado – a Foster Wheeler. Esta empresa norte-americana absorveu um dos desenvolvedores da tecnologia citados acima, a Ahlström, e forneceu caldeiras fabricadas em Sertãozinho para a indústria da celulose através da subsidiária Foster Wheeler América Latina. Há mais de 10 anos, portanto, Sertãozinho já fornecia Leito Fluidizado Borbulhante, mas somente nos últimos anos esta nova tecnologia passou a ser aplicada no setor sucroenergético. Na época citada, a Foster Wheeler América Latina iniciou estudos para queima de bagaço de cana em leito fluidizado, mas a conclusão foi que a tecnologia de grelha pinhole, completamente nacional e com menor CAPEX, era a mais apropriada para as necessidades das usinas na época.

A evolução do setor – principalmente sua mudança de produtor de açúcar e etanol para incluir um foco na exportação de energia elétrica – trouxe mudança nos antigos paradigmas. Todo o sistema de geração de energia precisou aumentar sua eficiência para possibilitar a geração de energia excedente exportável. O que isto significou para as caldeiras? Significou o desenvolvimento de caldeiras de maiores capacidades, pressões, temperaturas, eficiências e flexibilidade em queima de diversos tipos de combustíveis. Além disso, o combustível tipo bagaço de cana também mudou, devido ao aumento da colheita mecanizada com cana crua sem queima, levando para a indústria mais impurezas vegetais e minerais. Combustíveis com alto teor de cinzas, umidade mais alta e consequente baixo poder calorífico, necessitam de uma tecnologia mais avançada para combustão com alta eficiência.

Nosso objetivo aqui é fazer uma análise imparcial das tecnologias – grelha pinhole x leito fluidizado borbulhante, aplicadas à situação atual e ao futuro do setor. Nossa empresa – a Caldema – fornece caldeiras com ambas às tecnologias e prima por uma condução imparcial visando oferecer a melhor solução para cada aplicação.

A tecnologia BFB – Bubling Fluidized Bed/Leito Fluidizado Borbulhante – é aplicada  mundialmente na queima de biomassas com alto teor de umidade e baixo poder calorífico. É de conhecimento que bagaço de cana com umidade acima de 55%, não queima adequadamente em caldeiras de grelha. Resumidamente, o leito fluidizado borbulhante é formado por um grande volume de areia, que se “fluidiza” ao receber uma quantidade de ar por baixo, a alta pressão, com bicos de sopragem adequadamente dimensionados. Essa massa de areia é aquecida por queimadores, e em seguida o combustível começa a ser injetado, e passa a queimar no leito de areia, dispensando o uso dos queimadores de partida, que são então apagados.

Durante a operação da caldeira, este grande volume de areia com temperatura controlada em  850ºC, promove uma grande estabilização da combustão e queima completa do combustível. O resultado é uma caldeira mais estável em termos de produção, pressão e temperatura do vapor, suportando melhor as variações de umidade, granulometria e poder calorífico do combustível, comparada a uma caldeira com grelha.

Outra vantagem é a capacidade da caldeira queimar combustível com alto teor de impureza mineral – terra, areia. Como o BFB usa areia para fluidização, a impureza mineral presente no combustível reduz o consumo de areia de reposição, sendo que o nível é facilmente controlado por roscas de drenagem instaladas no fundo do leito.

A queima completa do combustível com eficiência de combustão acima de 99,7% e a menor quantidade necessária de ar de combustão (excesso de ar), são outras vantagens desta tecnologia. As perdas por combustível não queimado são menores que 0,3%, contra 1,0% a 3,0% nas caldeiras com grelha. O baixo excesso de ar de 20 a 25% contra 30 a 40% nas caldeiras com grelha e a correta divisão de ar secundário e terciário na fornalha – resultam em menores emissões de poluentes (materiais particulados e óxidos de nitrogênio NOx). A princípio esta redução de vazão de ar e gases de combustão reduz o consumo de energia elétrica nos ventiladores. A eficiência de caldeiras BFB supera 90% contra até 88% de caldeiras equivalentes com grelha.

As vantagens estão claramente definidas acima, sendo defendidas e divulgadas no mercado sucroenergético  como vantagens absolutas. Mas é bom conhecer os dois lados da moeda, para não haver arrependimentos ou decepções futuras. Sem dúvida a tecnologia BFB é a melhor, para a aplicação correta. Assim como a grelha pinhole é a melhor tecnologia quando aplicada corretamente.

A fluidização é obtida com a injeção de ar de alta pressão no leito, como já dito, e isto significa um consumo de potência em ventiladores mais alto que em caldeiras de grelha. Ainda com relação ao consumo de energia elétrica, há necessidade de instalação de um ventilador para recirculação dos gases – FGR (Flue Gas Recirculation). Essa recirculação é necessária para controlar a temperatura do leito em caso de alimentação de combustível com baixa umidade. Portanto, a caldeira BFB tem consumo de energia maior do que uma equivalente de grelha pinhole, mesmo considerando a redução por não queimado e excesso de ar.

Outra preocupação é com a presença de contaminantes nos combustíveis. A palha de cana e algumas biomassas de rápido crescimento, levam do solo para a caldeira componentes alcalinos, principalmente potássio e sódio, além de cloro e fósforo. A quantidade desses contaminantes no combustível deve ser claramente analisada pelo fornecedor da caldeira, e pode modificar os parâmetros de projeto. O potássio e o sódio aumentam a aglomeração da areia do leito e o cloro aumenta a corrosão dos componentes da caldeira. O desconhecimento destes contaminantes na ocasião do orçamento ou execução do projeto, pode trazer problemas operacionais a longo prazo, diminuindo a disponibilidade da caldeira.

Em resumo, apesar de a tecnologia BFB ser amplamente aplicada para queima de biomassas em geral, ainda é nova para bagaço de cana, e sua aplicação para cada biomassa deve ser discutida sem paixões ou interesses comerciais, para que o fornecedor e o usuário conjuntamente definam a melhor solução para cada aplicação. Tendo esse cuidado o proprietário da caldeira terá um equipamento confiável e disponível para fornecer energia durante muitas décadas, mantendo a disponibilidade dentro do desejado. Este é um termo razoavelmente novo para o setor, porém conhecido no setor de geração de energia elétrica, e significa o tempo garantido que a Central Térmica pode operar durante um ano, chegando a valores próximos de 99,5%.

Para finalizar, vamos falar do futuro, que um dia será presente. Qual a tendência do setor e quais serão as tecnologias de combustão em caldeiras nos próximos anos? Entendo que o BFB terá uma participação significativa nas novas unidades de cogeração com eficiências, pressões e capacidades crescentes, mas que as caldeiras com grelha pinhole, de conceito moderno de elevada queima em suspensão, continuarão sendo também importantes. O aumento de capacidades nos levará a mais uma vez, seguir o caminho dos nossos colegas finlandeses: as caldeiras de Leito Fluidizado Circulante – CFB. Hoje existem caldeiras na Europa com capacidade acima de 600 t/h projetadas com esta tecnologia, que superou a tecnologia BFB em aplicações de alta capacidade.

Apesar de ter feito referencia à Finlândia como tecnologia de ponta na queima de biomassas em geral, quando falamos especificamente de bagaço de cana, a experiência, tecnologia e pioneirismo brasileiro é insuperável. E através do desenvolvimento contínuo de nossas empresas, tecnologias e parcerias tecnológicas vamos manter esta liderança e superar as dificuldades atuais do setor.

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